Vai trabalhar, vagabundo!

“Do suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás.” (Gênesis, 3:19)

Quando você pensa no futuro, o que vem à sua mente? A não ser que você tenha sido criado em outro planeta ou em outros tempos, a sua resposta é: trabalho. É com trabalho que conseguimos dinheiro, pra poder descansar. É uma lógica tão estúpida que não sei como ainda funciona.

Vai trabalhar, vagabundo Vai trabalhar, criatura Deus permite a todo mundo Uma loucura Passa o domingo em familia Segunda-feira beleza Embarca com alegria Na correnteza

Prepara o teu documento Carimba o teu coração Não perde nem um momento Perde a razão Pode esquecer a mulata Pode esquecer o bilhar Pode apertar a gravata Vai te enforcar Vai te entregar Vai te estragar Vai trabalhar

Vê se não dorme no ponto Reúne as economias Perde os três contos no conto Da loteria Passa o domingo no mangue Segunda-feira vazia Ganha no banco de sangue Pra mais um dia

Cuidado com o viaduto Cuidado com o avião Não perde mais um minuto Perde a questão Tenta pensar no futuro No escuro tenta pensar Vai renovar teu seguro Vai caducar Vai te entregar Vai te estragar Vai trabalhar

Passa o domingo sozinho Segunda-feira a desgraça Sem pai nem mãe, sem vizinho Em plena praça Vai terminar moribundo Com um pouco de paciência No fim da fila do fundo Da previdência Parte tranquilo, ó irmão Descansa na paz de Deus Deixaste casa e pensão Só para os teus A criançada chorando Tua mulher vai suar Pra botar outro malandro No teu lugar Vai te entregar Vai te estragar Vai te enforcar Vai caducar Vai trabalhar

(Chico Buarque)

O trabalho do “proletário” como existe hoje surgiu com a Revolução Industrial, no século XVIII. É engraçado que, quando estudamos esse período na escola, todos adoram criticá-lo; parece que faz parte de uma realidade distante e que hoje ninguém é proletário. Ninguém pensa no hoje e na nossa situação, porque todos estão conformados.

Antes do proletariado surgir, existiam outras formas de trabalho, como os artesãos e os escravos. Os artesãos trabalhavam por eles mesmo, não para burgueses. Os escravos trabalhavam para um senhor, mas esse site explica bem a diferença entre o proletário e o escravo:

Como se diferencia o proletário do escravo?

O escravo está vendido de uma vez para sempre; o proletário tem de se vender a si próprio diariamente e hora a hora. O indivíduo escravo, propriedade de um senhor, tem uma existência assegurada, por muito miserável que seja, em virtude do interesse do senhor; o indivíduo proletário – propriedade, por assim dizer, de toda a classe burguesa -, a quem o trabalho só é comprado quando alguém dele precisa, não tem a existência assegurada.

O trabalho não é uma necessidade. Quem não trabalha não é vagabundo. A própria palavra “trabalho” vem de “tripalium” e lembra tortura, sofrimento. A nossa mentalidade é baseada em uma série de conceitos que foram se formando ao longo do tempo e que pouca gente pára pra pensar se estão certos.

Qual é a solução? Um comunismo? Não sei, acho que não, mas também não tenho a resposta. Cada um pode decidir por si só, mas acho que do jeito que tá não é legal. Passamos a vida “escravos” de um sistema por dinheiro. Pensem bem: isso não faz sentido! Tem coisas muito melhores pra se fazer e pra se ter na vida. Às vezes parecemos retroceder em vez de evoluir. No fim, o que é importante?

Ninguém jamais deveria trabalhar. O trabalho é a fonte de quase todos os sofrimentos no mundo. Praticamente qualquer mal que se possa mencionar vem do trabalho ou de se viver num mundo projetado para o trabalho. Para parar de sofrer, precisamos parar de trabalhar.

(Hakim Bay)

John Chow é O Cara!

John Chow é um blogueiro que está ganhando bem, talvez o suficiente pra viver de um blog. Ele conta em seu blog que ganhou US$ 355 em setembro, US$ 1362 em outubro e US$ 2140 em novembro. Mas John é um sujeito caridoso e ele escreveu que nunca foi sua intenção fazer dinheiro com o blog:

I have decided to donate the income from the blog to my church and other charities. John Chow dot Com is my personal blog and making a profit from it just seems strange to me. Please note, I am not downing anyone who makes money off his or her personal blog – I think that is great.

Então, ele doou US$ 2000 para instituições de caridade e igrejas, para ajudar as pessoas e promover o natal de centenas de pobres.

Assim como o Rafael, não sei o que dizer. Achei que não existissem pessoas assim no mundo. A minha hipocrisia não me permitiria fazer isso com o meu dinheiro.

A atitude de John Chow foi bonita, digna de um louco! :-) Se todos fossem iguais a ele, nosso mundo seria melhor. Ou não? Disse o Rafael na resposta de um comentário que eu coloquei no site dele:

Trabalhamos e temos uma recompensa que é o dinheiro com a qual conseguimos as coisas.

É uma lógica totalmente capitalista e é corretíssima dentro do nosso sistema. Mas será que é certa? Será que podemos/devemos ser diferentes de todo o resto da sociedade?

© 2005–2020 Tiago Madeira