O dia em que passei na USP

Agora faz quase um mês. Do nada me veio na cabeça e lembrei que preciso registrar. Era 11 de março, quarta-feira. Floripa estava extremamente ensolarada e andar na rua me fazia suar.

O dia corria normalmente. Acordei cedo e fui para a UFSC, porque estava dando aulas de preparação para a OBI para os calouros todos os dias. Estava com muito sono, porque na terça dois amigos tinham vindo à minha casa comer um bife e acabei indo dormir tarde. Não lembro ao certo o que ensinei para os calouros, mas ainda estava no básico de C. Se eu não me engano, foi vetores.

Às 10:00 eu tive aula de H-Cálculo III. As aulas de H-Cálculo são as que mais sinto falta aqui na USP. Era um curso extremamente rigoroso, a ponto de provar todas as propriedades de limites, derivadas e integrais a partir de teoria dos conjuntos e de treze axiomas dos reais. A aula do dia era sobre o Teorema de Bolzano-Weierstrass em Rn\mathbb{R}^n.

Seja SRnS \subset \mathbb{R}^n um conjunto limitado contendo uma quantidade infinita de pontos. Então existe pelo menos um ponto de Rn\mathbb{R}^n que é ponto de acumulação de SS.

A idéia da prova não é muito complexa, mas a prova em si, rigorosa como o professor gostava, é grande. Três horas e cinco páginas de caderno depois, a aula acabou depois da demonstração do Teorema da Interseção de Cantor.

O problema das aulas de quarta do PAM era que perdíamos o horário de almoço. Nesta quarta em especial eu comi um pão de queijo e segui para a sala em que passava o dia na UFSC, a INE513. A INE513 é uma sala que nós [maratonistas] ganhamos com três máquinas (que conjecturo que sejam as mais antigas do departamento). Era um lugar pequeno, mas tinha ar condicionado e era muito bom para passar o tempo e estudar.

No térreo do INE encontrei dois amigos que também estavam indo estudar para a Maratona. Eles falavam com um gringo e eu entrei na conversa. O espanhol estava procurando um freelancer na área de desenvolvimento web para pôr em prática uma grande idéia que ele teve. Ele pediu para usar um computador para me mostrar o que ele queria e levei-o para a INE513. Lá ele explicou durante mais de uma hora o que ele queria e ao fim ficou com meu e-mail para entrar em contato.

Assim que ele foi embora (era por volta das 15:00), resolvi dar uma olhada no site da Fuvest para ver se algum conhecido tinha sido aprovado na quarta chamada.

Não cogitava a hipótese de eu ter sido aprovado, porque minha classificação na carreira de “Engenharia Politécnica e Computação” foi 1322 (enquanto o último colocado da quarta chamada do ano passado tinha ficado com classificação 1181).

Meu desempenho na Fuvest

Porém, para minha surpresa, meu nome estava na lista. Minha primeira frase foi:

“Vinícius, passei no IME!”

Ele não acreditou. Ninguém acreditaria. Nem eu acreditava. Meus planos pro primeiro semestre já estavam feitos lá na UFSC e minha grade de horários só tinha aulas boas: H-Cálculo III, H-Álgebra Linear III e Álgebra I.

Liguei para os meus pais e para a minha namorada. Mandei e-mails para os meus irmãos e para meus tios paulistanos que me abrigaram durante várias provas de vestibular e transferência nos dois anos anteriores.

Parei pra ler o manual da Fuvest, em especial a parte de matrículas. Descobri que deveria estar em São Paulo na sexta-feira, 13. Ou seja, deveria sair correndo.

Eufórico, perdi mais algum tempo com o manual e saí andando pela UFSC em busca dos documentos necessários. Por um ato falho, cheguei até a porta da aula de Álgebra, mas não cheguei a entrar.

Conseguir a desmatrícula na UFSC foi difícil. Eu devia um real para a biblioteca e só podia pagar através de uma Transferência para a Conta Única do Tesouro Nacional, i.e., deveria enfrentar a fila do caixa do Banco do Brasil. Na quarta não consegui mais nada, mas fiquei até umas 21:00 na INE513 conversando com meus colegas da UFSC Time Limit Exceeded.

No dia seguinte acordei cedo novamente e, após mais uma aula para calouros e a desmatrícula na UFSC, almocei com meus amigos na Pizza Hut. Logo depois do almoço “de despedida”, num sol de rachar, saí de casa com tudo que consegui e peguei um ônibus para Itajaí, de onde no mesmo dia partiria para São Paulo e para uma nova vida.

São Paulo - Consolação (crédito: Jefferson Breves/flickr)

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